06 May 2007

Notas sobre o Cinematografico

Robert Bresson - (excerptos de) “Notas sobre o Cinematografico”
(Notes sur le cinématographe, Paris, Gallimard, 1975)


Precisão de mestre. Ser eu próprio um instrumento de precisão.

Nenhuns actores.
(Nenhuma direcção de actores). Nenhuns papéis.
(Nenhuma aprendizagem de papéis). Nenhuma encenação.
Mas o uso de modelos de trabalho, tirados da vida.
SER (modelos) em vez de PARECER (actores).

O que interessa não é o que eles me mostram mas o que eles me escondem e, acima de tudo, o que não suspeitam que está neles.

Aplicar-me às imagens insignificantes (não-significantes).

Aplanar (tornar planas) as minhas imagens (como que passando-as a ferro), sem as atenuar.

(...) Colocarmo-nos num estado de intensa ignorância e curiosidade, e no entanto prever as coisas.

Apaixonados pelo apropriado.

Um todo feito de boas imagens pode ser detestável.

A mistura do verdadeiro e do falso produz falsidade (…).

O falso quando é homogéneo pode produzir verdade (…).

(...) Nenhuma parte do inesperado que não seja secretamente esperada por nós.

Cava fundo onde estás. Não deslizes para outro lado.
Duplo, triplo fundo das coisas.

Não corras atrás da poesia. Ela penetra sem ajuda através das juntas.

Deixa que sejam os sentimentos a fazer surgir os eventos (…) e não ao contrário.

Nenhum mecanismo cerebral ou intelectual. Apenas um mecanismo.

Não artístico, mas ágil.

O próprio Debussy costumava tocar com a tampa do piano fechada.

Desmantelar e reconstruir até que obtenhamos intensidade.

Torna-te homogéneo com os teus modelos, torna-os homogéneos contigo.

Devolve o passado ao presente. Magia do presente.

Pratica o preceito: encontrar sem procurar.

Nesta linguagem de imagens, temos de perder completamente a noção de imagem. As imagens devem excluir a ideia de imagem.

Ter discernimento (precisão na percepção).

As ligações de que os seres e as coisas estão à espera, para poderem viver.

O verdadeiro é inimitável, o falso intransformável.

Retoca um pouco de real com um pouco de real.

Não criamos ao adicionar, mas ao retirar.

Esvazia o lago para chegar ao peixe.

Provoca o inesperado. Espera-o.

O real cru não produzirá verdade por si mesmo.

Faz com que os objectos pareçam que querem ali estar.

Sê tão ignorante do que vais apanhar como o pescador do que está no fim da cana de pesca.

Forjar para nós próprios leis férreas, ainda que só para lhes obedecermos ou desobedecermos com dificuldade.

O público não sabe o que quer. Impõe-lhe as tuas decisões, as tuas delícias.

Produção de emoção determinada por uma resistência à emoção.

Ser escrupuloso. Rejeitar tudo o que, do real, não se torna verdade.